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Preservação da Fertilidade da Mulher com Câncer

Brunno Falcão

5 min

18 de jul. de 2024

Receber um diagnóstico de câncer é um momento delicado, onde muitas pacientes não têm condições de pensar sobre fertilidade. Contudo, é crucial que os profissionais de saúde as orientem sobre essa possibilidade, preparando seus corpos para uma futura gestação . Nos últimos anos, tanto os casos de câncer quanto os de infertilidade têm aumentado significativamente. Entre 10 a 12% dos diagnósticos de câncer ocorrem em pessoas em idade reprodutiva . Assim, é fundamental não apenas focar na sobrevida, mas também na qualidade de vida após o tratamento .   Desafios e Possibilidades no Tratamento da Fertilidade Existem diversos estudos que destacam a preocupação das pacientes com sua fertilidade após o tratamento de câncer. Fatores como sexo biológico, status puberal e tipo de câncer  (como o câncer de mama) podem influenciar a continuidade dos tratamentos de preservação . Por outro lado, barreiras como custos financeiros, questões religiosas e o sexo feminino são desafios comuns enfrentados nesse processo.   Avaliação da Reserva Ovariana e Técnicas de Preservação A realização de exames para avaliação da reserva ovariana é fundamental, considerando que alguns valores de referência podem não refletir a realidade de cada paciente . Exames como o anti-mulleriano  devem ser analisados em relação aos percentis correspondentes à idade da paciente.   Opções de Preservação da Fertilidade Existem três fatores  que podem prejudicar a reserva ovariana  da paciente em tratamento: o primeiro  são as terapias, como quimioterapia e radioterapia . A quimioterapia agride os folículos de forma tão grave que danifica a fita dupla de DNA , necessitando de reparo e causando atrofias significativas. Os oócitos também são sensíveis à radioterapia. A dose necessária para causar falência ovariana é inversamente proporcional à idade. O segundo  fator é o envelhecimento ovariano, e o terceiro é o próprio câncer . Alguns tipos de câncer, especialmente os hematológicos com alta concentração de citocinas pró-inflamatórias, reduzem a reserva ovariana .  Pacientes  pré-púberes  podem optar pela criopreservação de tecido ovariano , enquanto as pós-púberes  têm alternativas como o congelamento de óvulos e embriões, além da transposição ovariana . O tempo disponível para o tratamento é um critério crucial a ser discutido com o oncologista, influenciando a escolha da técnica mais adequada. Indução da Ovulação e Segurança Oncológica   A medicação para congelamento de óvulos e embriões requer cuidado no momento hormonal . É um processo detalhado que envolve o uso de gonadotrofinas e o controle preciso do ciclo ovariano  para evitar complicações. Iniciamos com as gonadotrofinas, como o FSH. Quando o estradiol aumenta, há um pico de LH que provoca ovulação. Sabemos que em torno de 13 a 14mm a paciente ovulará naturalmente , então precisamos administrar um antagonista do LH para impedir esse pico. Continuamos a dar FSH, e quando o folículo chega a 18mm, ele está pronto para ser aspirado . Neste ponto, precisamos do pico de LH, que pode ser induzido com HCG ou um agonista de LH. Os óvulos devem ser coletados cerca de 35 horas depois . Atualmente, não precisamos esperar a mulher menstruar para iniciar; basta um ultrassom mostrando um folículo grande.   A indução da ovulação eleva o estradiol . Estudos demonstraram que essa elevação não aumenta a taxa de recorrência do câncer de mama . As pacientes que fizeram o tratamento tiveram uma recorrência de 8%, enquanto as que não fizeram tiveram 16%. Outro estudo apresentou um prognóstico pior para aquelas que fizeram o tratamento. Atualmente, introduz-se o letrozol  desde o início do tratamento até algum tempo depois.  É fundamental que o profissional oriente a paciente sem impor julgamentos sobre suas decisões em relação à preservação da fertilidade . Respeitar as escolhas individuais  é essencial para garantir o apoio adequado durante esse processo desafiador. Técnicas e Considerações Oncológicas em Preservação da Fertilidade: Estratégias e Desafios A criopreservação de tecido ovariano é indicada em casos de urgência do tratamento oncológico , em pacientes pré-púberes  e também em mulheres com tumores hormônio-dependentes . O tecido é descongelado, transplantado, seguido pela neovascularização e início da foliculogênese, com redução de FSH e aumento de estradiol, resultando em menstruação. A transposição ovariana protege a função ovariana  movendo os ovários para fora do campo de radiação. No entanto, acarreta riscos como aderências pós-operatórias, dor pélvica crônica e dificuldades para coleta de oócitos para FIV . Este procedimento não previne danos ovarianos por drogas citotóxicas, sendo evitado se a paciente tiver que se submeter à quimioterapia e radioterapia. Como tratamento complementar, podemos dar à paciente um análogo do GnRH de longa duração durante a quimioterapia , visando à supressão transitória da função ovariana. Deve ser iniciado pelo menos 10 dias antes do início da quimioterapia e continuar até duas semanas após o término. Sobre a oncogenética , dados mostram que de 5 a 10% dos cânceres de mama têm origem genética. A ordem de preferência para a transferência é: 1)  Embriões sem mutação; 2)  Embriões com mutação do sexo masculino BRCA1: 1% risco de câncer de mama; BRCA2: 20-25% risco de câncer de próstata (>45 anos) e 7% risco de câncer de mama); 3)  Embriões com mutação do sexo feminino (BRCA1: 44% risco de câncer de ovário e 72% risco de câncer de mama (<80 anos); BRCA2: 44% risco de câncer de ovário e 69% risco de câncer de mama (<80 anos). Aspectos Genéticos e Oncológicos  Dados indicam que uma proporção significativa dos cânceres de mama tem origem genética , influenciando decisões sobre transferência de embriões. É essencial discutir essas questões com a paciente e oferecer suporte  no processo de tomada de decisão. Em resumo, a preservação da fertilidade em pacientes com câncer é uma área complexa que requer cuidados multidisciplinares . Orientar, informar e respeitar as decisões das pacientes  são passos fundamentais para garantir a melhor qualidade de vida possível após o tratamento oncológico. Prática Clínica É crucial que assim que o diagnóstico seja feito, a paciente seja encaminhada para uma equipe especializada em fertilidade  para discutir suas opções. Além disso, é essencial avaliar o tipo de tratamento oncológico  prescrito, pois alguns podem afetar gravemente a reserva ovariana . Por fim, a idade da paciente e sua reserva ovariana são fatores críticos a serem considerados, especialmente os folículos primordiais , que são os mais sensíveis aos tratamentos de câncer Continue Estudando... Sugestão de Estudo: Abordagens Nutricionais no Tratamento Pós Câncer Sugestão de Estudo: Os Micronutrientes Reduzem o Câncer? Sugestão de Estudo: Obesidade e Câncer: Entenda a Relação e os Riscos Referências Bibliográficas WU, Meng; ZHU, Qingqing; HUANG, Yibao; TANG, Weicheng; DAI, Jun; GUO, Yican; XIONG, Jiaqiang; ZHANG, Jinjin; ZHOU, Su; FU, Fangfang. Ovarian reserve in reproductive-aged patients with cancer before gonadotoxic treatment: a systematic review and meta-analysis.   Human Reproduction Open , [S.L.], v. 2023, n. 3, 1 jan. 2023. Oxford University Press (OUP). ROMITO, Alessia; BOVE, Sonia; ROMITO, Ilaria; ZACE, Drieda; RAIMONDO, Ivano; FRAGOMENI, Simona Maria; RINALDI, Pierluigi Maria; PAGLIARA, Domenico; LAI, Antonella; MARAZZI, Fabio. Ovarian Reserve after Chemotherapy in Breast Cancer: a systematic review and meta-analysis.   Journal Of Personalized Medicine , [S.L.], v. 11, n. 8, p. 704, 23 jul. 2021. MDPI AG.